Última sessão de domingo, amigos cinéfilos e eu fomos conferir não o mais recente trabalho de Tarantino, porque Bastardos Inglórios foi o mais recente, mas o mais polêmico entre eles – a crítica caiu matando.
Inevitável não psicanalisar sobre ele. O filme tem como protagonista o ator Kurt Russell, numa ótima atuação, fazendo o papel de um perversão escrachado - adornado com todos os clichês da maldade. Quando digo perverso, refiro-me às variadas definições que a palavra traz. Vou explicar melhor. O termo “perversão”, em seu uso corrente, tem uma conotação desagradável, negativa. Para a psicanálise não é a regra. A perversão constitui uma estrutura, ao lado da neurótica e da psicótica. O sujeito perverso, de um modo bem sintético, é aquele que conhece a lei, conhece a castração, mas a renega, utilizando-se do artifício do fetiche para tamponar a falta constituinte de todo o humano. Não dispomos, infelizmente, senão de uma única palavra – perverso - para designar indistintamente os sujeitos marcados pela perversidade e aqueles que sofrem de perversão dos instintos elementares e que configuram a estrutura perversa postulada por Freud e revista por Lacan. Aliás, o uso confunde abusivamente essas duas categorias, entre as quais existem obscuras e freqüentes associações. O perverso de estrutura clínica, afirma Lacan, é aquele que sabe do gozo do outro e se coloca a suturar sua falta, fazendo com que o outro acredite que não há castração. Cair nas teias nefastas do perverso não é prerrogativa de poucos. É muito fácil. Se ele sabe do seu modo de gozar e te oferece exatamente o que te faz gozar, como não cair? Lembram do Barba Azul, do Don Juan, maníaco do parque? O que eles tinham em comum, a não ser o fato de se darem de corpo e alma a obturar o desejo do outro? Por que aquelas mulheres caíam nesse logro? Elementar, não é?
O único consolo é saber, tanto pela teoria quanto pela prática, que nem todo o algoz foi um dia vítima, mas que toda vítima, quando sobrevive, incorporará um algoz mais competente que o seu próprio mestre.
O filme trata disso.
Deixo para vocês a decisão de assistir ou não ao filme. Não estou recomendando, pois como o tema mexe com os nossos diabinhos, uns gostam e outros nem tanto.
“O que induz a gente para más ações, estranhas, é que a gente está pertinho do que é nosso, por direito, e não sabe, não sabe, não sabe!” Guimarães Rosa em Grande Sertão Veredas
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