quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Morte e morrer

Quando acreditava que meus ídolos já haviam tido os seus apogeus criativos, e que de agora em diante o que viesse era lucro, Gilberto Gil me surpreendeu com a canção de sua autoria “Não tenho medo da morte".
De forma poética, mas nada pueril, Gil vai desfazer o pretenso parentesco que existe entre a morte e o morrer. A morte está sempre à espreita dos seres de reprodução sexuada. Só que em alguns momentos da vida, ela se presentifica com mais voracidade e, para quem duvida mais do que acredita, é sempre um tempo de reflexão e solidão. Gil, agora um pré-septuagenário, retrata, quase sem abstrações, a angústia que dele se apropria quando vislumbra o ato de morrer, ao mesmo tempo em que o estado morte lhe causa senão indiferença. Sei que a discriminação entre a morte e o morrer não é uma sacada original ou genial. O inédito da coisa é musicar o tema e fazê-lo bem; e belo.

“Não tenho medo da morte

Não tenho medo da morte
Mas sim medo de morrer
Qual seria a diferença
Você há de perguntar
É que a morte já é depois
Que eu deixar de respirar
Morrer ainda é aqui
Na vida, no sol, no ar
Ainda pode haver dor, hein
Ou vontade de mijar
A morte já é depois
Já não haverá ninguém
Como eu aqui agora
Pensando sobre o além
Já não haverá o além
O além já será então
Não terei pé nem cabeça
Nem fígado, nem pulmão
Como poderei ter medo, hein
Se não terei coração?
Não tenho medo da morte
Mas medo de morrer sim
A morte é depois de mim
Mas quem vai morrer sou eu
Derradeiro ato meu
E eu terei de estar presente
Assim como um presidente
Dando posse ao sucessor
Terei que morrer vivendo, hein
Sabendo que já me vou
Aí nesse instante então
Sofrerei quem sabe um choque
Um piripaque, um baque
Um calafrio ou um toque
Coisas naturais da vida
Como comer, caminhar
Morrer de morte matada
Morrer de morte morrida
Quem sabe eu sinta saudade, hein
Como em qualquer despedida.”

Gilberto Gil em Banda Larga Cordel, lançamento de 2009

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. O que eu penso?
    Miedo
    Lenine
    Composição: Pedro Guerra/Lenine/Robney Assis

    Tienen miedo del amor y no saber amar
    Tienen miedo de la sombra y miedo de la luz
    Tienen miedo de pedir y miedo de callar
    Miedo que da miedo del miedo que da

    Tienen miedo de subir y miedo de bajar
    Tienen miedo de la noche y miedo del azul
    Tienen miedo de escupir y miedo de aguantar
    Miedo que da miedo del miedo que da

    El miedo es una sombra que el temor no esquiva
    El miedo es una trampa que atrapó al amor
    El miedo es la palanca que apagó la vida
    El miedo es una grieta que agrandó el dolor

    Tenho medo de gente e de solidão
    Tenho medo da vida e medo de morrer
    Tenho medo de ficar e medo de escapulir
    Medo que dá medo do medo que dá

    Tenho medo de acender e medo de apagar
    Tenho medo de esperar e medo de partir
    Tenho medo de correr e medo de cair
    Medo que dá medo do medo que dá

    O medo é uma linha que separa o mundo
    O medo é uma casa aonde ninguém vai
    O medo é como um laço que se aperta em nós
    O medo é uma força que não me deixa andar

    Tienen miedo de reir y miedo de llorar
    Tienen miedo de encontrarse y miedo de no ser
    Tienen miedo de decir y miedo de escuchar
    Miedo que da miedo del miedo que da

    Tenho medo de parar e medo de avançar
    Tenho medo de amarrar e medo de quebrar
    Tenho medo de exigir e medo de deixar
    Medo que dá medo do medo que dá

    O medo é uma sombra que o temor não desvia
    O medo é uma armadilha que pegou o amor
    O medo é uma chave, que apagou a vida
    O medo é uma brecha que fez crescer a dor

    El miedo es una raya que separa el mundo
    El miedo es una casa donde nadie va
    El miedo es como un lazo que se apierta en nudo
    El miedo es una fuerza que me impide andar

    Medo de olhar no fundo
    Medo de dobrar a esquina
    Medo de ficar no escuro
    De passar em branco, de cruzar a linha
    Medo de se achar sozinho
    De perder a rédea, a pose e o prumo
    Medo de pedir arrego, medo de vagar sem rumo

    Medo estampado na cara ou escondido no porão
    O medo circulando nas veias
    Ou em rota de colisão
    O medo é do Deus ou do demo
    É ordem ou é confusão
    O medo é medonho, o medo domina
    O medo é a medida da indecisão

    Medo de fechar a cara
    Medo de encarar
    Medo de calar a boca
    Medo de escutar
    Medo de passar a perna
    Medo de cair
    Medo de fazer de conta
    Medo de dormir
    Medo de se arrepender
    Medo de deixar por fazer
    Medo de se amargurar pelo que não se fez
    Medo de perder a vez

    Medo de fugir da raia na hora H
    Medo de morrer na praia depois de beber o mar
    Medo... que dá medo do medo que dá
    Medo... que dá medo do medo que dá

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